foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo
Ciúme tende a ser o principal causador de rivalidades na primeira
infância; omissão dos pais pode afetar negativamente a personalidade dos filhos
Pais não devem subestimar os desafios emocionais que a chegada de um
segundo filho pode trazer à família. Mesmo aqueles que se adaptaram bem à nova
vida após a primeira gravidez precisam se preparar para a reação do primogênito
ao notar que o afeto e o tempo dos pais têm de ser divididos. Embora o
surgimento do ciúme seja encarado com naturalidade por psicólogos e educadores,
eles alertam para a necessidade de agir para minimizá-lo, sob o risco de
alimentar rivalidades e afetar a autoestima dos irmãos.
Mesmo quando o período de gravidez parece ser bem recebido pelo filho
mais velho, com demonstrações de carinho na barriga da mãe, por exemplo, isso
tende a mudar assim que o irmão vem ao mundo. “Enquanto a criança está na
barriga da mãe, o novo irmão é bem aceito porque o mais velho não sabe como é
conviver com ele e todas as suas consequências”, diz a diretora da Escola
Atuação, Esther Cristina Pereira. Os problemas tendem a aparecer quando o
recém-chegado começa a interagir mais com as pessoas ao redor, fazendo gestos e
dando sorrisos.
Observação ajuda a identificar crises
Os irmãos Lucas e Felipe (foto), 12 e 10 anos,
respectivamente, se adoram. Pelo menos é o que diz o padrasto Dário Alberto
Pires Castro. A boa relação, no entanto, não está imune a pequenas desavenças.
“Quando alguém diz para o outro alguma coisa inadequada, a gente chama os dois
na hora, conversa e resolve rápido.” Segundo Castro, a ação rápida logo que um
problema é detectado é um dos segredos para que conflitos sejam evitados. “É
preciso ficar atento aos sinais que os filhos dão. Quando alguém fica muito
tempo sozinho no quarto, conversa pouco e não sai do computador, é porque há
algum problema”, diz.
Erros comuns
A experiência mostra que algumas atitudes dos pais
não ajudam a manter a paz entre os irmãos. Confira os erros mais comuns:
Omitir-se
Subestimar as brigas entre irmãos, tratando-as como
algo passageiro e sem importância, é a desculpa de muitos pais para não se
envolverem, na esperança de que os brigões se entendam por conta própria. A
omissão resulta em duas consequências graves: alimentar um clima de hostilidade
na família, sem limites ou punições, e abandonar o mais fraco, que sofrerá mais
em cada briga.
100% para
o bebê
No caso dos pais que acabam de ter um bebê, um erro
grave é o de dedicarem-se quase que exclusivamente ao recém-nascido. Por mais
que o bebê necessite de cuidados especiais, a família deve fazer um esforço de
revezamento e organização para que ninguém se sinta “trocado”. Mais do que
nunca, o mais velho cobrará tempo de qualidade e o comportamento dos pais nesse
momento será essencial para que ele acolha bem o irmão mais novo.
Centralizar
demais
A ânsia de algumas mães por atender a contento e
sozinhas a todos os filhos pode resultar em uma rotina estressante e
impraticável. É preciso pedir ajuda e delegar. Quando as crianças estão em
idade escolar, a escola pode se tornar uma boa companheira, mas no caso dos
menores, o pai, tios, padrinhos e avós devem ser requisitados em pelo menos
algumas horas.
Ameaças
vazias
Ameaças de intervenção feitas com frequência, mas
nunca ou raramente cumpridas, contribuem com a perda de autoridade dos pais. Se
os pais desejam que os filhos parem de brigar logo que é feito o pedido, é
preciso mostrar que suas palavras têm valor. Dizer, por exemplo, que perderão
um brinquedo se não pararem e não fazer o confisco mesmo depois de
desobedecerem é fatal para a credibilidade das promessas futuras.
Fontes:
Rita Lous, Andréia Godoy e Esther Cristina Pereira.
A forma de demonstrar o ciúme pode variar, mas é raro o incômodo ser
expressado verbalmente. Cabe aos pais ficarem atentos às mudanças de
comportamento. “Muitas crianças demonstram a revolta na escola. Ficam mais
ansiosas e agressivas. Acabam fazendo a leitura de mundo de que todos estão
contra ela”, diz Esther. Há, no entanto, aquelas que se deprimem, param de se
alimentar com qualidade, dormem mal e falam menos.
Outra manifestação comum é a tentativa de retorno à rotina de um bebê.
Voltar a pedir chupeta, mamadeira ou fazer xixi na calça são algumas formas que
os mais velhos encontram para disputar a atenção dos pais, diz Andréia Godoy,
pedagoga do Colégio Expoente. Às vezes, até a saúde pode ser afetada, com o
aparecimento de febre sem explicação aparente.
Manifestações
A variedade de manifestações ocorre porque o próprio irmão enciumado não
entende o que está sentindo. “Há uma mistura de sentimentos que envolvem
alegria e raiva. Por um lado, as crianças realmente ficam felizes por contarem
com um irmão com quem brincar, por outro, há o medo de os pais o deixarem de
lado”, explica a psicóloga do Hospital Pequeno Príncipe Rita Lous.
Segundo ela, algumas crianças confundem os sentimentos e, em um mesmo
gesto, demonstram intenções opostas. “Na hora em que vão fazer um carinho, por
exemplo, dão um aperto forte demais na bochecha do irmão ou pedem para pegar no
colo e em seguida querem largar”, diz Rita. Para ela, a ambiguidade é a marca
dessa relação em crianças pequenas, mas, se houver omissão por parte dos pais,
as consequências podem afetar a personalidade de forma duradoura.
Especialmente quando chegam à adolescência, se um dos irmãos alimenta a
convicção de que o outro é preferido, o rancor pode dar origem a brigas
intensas, disputa por influência e o distanciamento da família.
Traduzir
sentimentos dos filhos e manter rotina evitam crises em casa
O diálogo é a solução de muitos problemas e, no caso da rivalidade entre
irmãos, deve ser o primeiro a ser usado. Para a psicóloga Rita Lous, conversar
com as crianças separadamente, dizer que as ama e que entende o que elas sentem
é algo que sempre alivia a tensão. “Nomear os sentimentos ajuda muito, baixando
a angústia de quem se sente prejudicado. A criança passa a entender melhor o
que está acontecendo com ela própria”, explica.
Mas, quando se trata de prevenir conflitos, nada é mais eficiente do que
uma rotina doméstica bem organizada. A pedagoga Esther Cristina Pereira
defende, por exemplo, que, quando um irmão está em idade escolar e o outro
ainda não, a chegada do filho que vem da escola deve ser um momento de acolhida
e atenção exclusiva ao mais velho. “Essa é a hora de conversar sobre como foi o
dia na escola, o que estudou, que atividades fez. Alguns pais simplesmente
param de ver a agenda dos filhos mais velhos quando nasce um bebê porque alegam
não terem tempo. Isso é péssimo para a criança”, diz.
Envolvimento
A divisão de tarefas é fundamental. No caso de bebês que precisam ficar
com a mãe, cabe ao pai ou aos familiares mais próximos garantirem companhia e
atenção por tempo extra ao filho mais velho, afirma Esther. “A presença do pai
tem de ser reforçada porque a mãe será sempre disputada pelos dois.”
Nessa situação, para Rita, a divisão de atenção tem de ser sempre
pensada e combinada, pois a tendência natural é a de que todos na casa centralizem
seus esforços em prol do bebê, o que nem sempre é justo.
JÔNATAS DIAS LIMA
Fonte: GAZETA DO POVO
0 comentários:
Postar um comentário